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quinta-feira, 28 de novembro de 2024

SÉRIE: SANTOS CASADOS

A santidade no matrimônio ao longo dos séculos.

SANTA PAULA ROMANA e TOXÓCIO
Paula nasceu em uma família nobre (seu pai, Rogato, era de uma linhagem que remontava a Agamemnon, e sua mãe, Blesila, era descendente dos Cipiões, dos Gracos e parente de Paulo Emílio) e nasceu no dia 5 de maio de 347, em Roma.

Foi criada na riqueza e suntuosidade costumeira entre as famílias aristocráticas da Roma do século IV. As pessoas eram cristãs porque esse era um sinal de boa criação e porque a casa imperial era cristã. porém, fora isso, não cuidavam dos ensinamentos de Cristo e viviam uma vida mundana, liam clássicos gregos e romanos e dedicavam-se à dança e à música.

Em 362, aos quinze anos, Paula casou-se com o senador Toxócio, que ainda era pagão e membro da nobre linhagem juliana. Foi um casamento cheio de frutos e muito feliz, no entanto, durou pouco: apenas 16 anos. Paula sofreu intensamente a sua perda, como o descreveria São Jerônimo em uma carta sobre a morte de Toxócio, em 378: "seu sofrimento foi tão intenso que ela mesma quase veio a falecer". Depois de 16 anos de uma vida conjugal, a viúva de trinta e um anos ficou sozinha com cinco filhos. Mesmo assim, Paula os educou para serem cristãos, e até santos: 

Na época em que o marido de Paula faleceu (em 378), existia um movimento cristão de renovação em Roma, concentrado no palácio de Monte Aventino. Este palácio era ocupado pela viúva Marcela, além de sua mãe, também viúva, e de sua filha adotiva. Santa Marcela nasceu em Roma entre 325 e 335, descendente de nobre linhagem, e ficou viúva com apenas sete meses de matrimônio, recusando subsequentes pedidos de casamento. Consagrou-se ao Senhor e reunia em seu palácio um grupo de piedosas viúvas e jovens virgens da cidade com a finalidade de buscar uma vida de estudos cristã. Marcela estudava com zelo as Sagras Escrituras e, de 382 a 385, durante sua permanência em Roma, São Jerônimo a instruiu em questões filosóficas e exegéticas. Quando do saque a Roma, Marcela foi barbaramente açoitada pelos soldados de Alarico I, mas conseguiu fugir com a filha adotiva, Principia, para a Basílica de São Paulo.

Nesse círculo ao redor de Santa Marcela, a viúva Paula encontrou refúgio e consolo. Ela cuidava dos pobres e doentes, distribuía esmolas e dedicava-se arduamente à educação de seus filhos. As necessidades alheias faziam-na esquecer de sua próprias dores. Lentamente, começou a distribuir cada vez mais a sua riqueza.

No ano de 385, seguindo o conselho de seu mentor espiritual, Jerônimo, Paula decidiu deixar Roma e tudo o que lhe era mais querido e fazer uma peregrinação ao Oriente, ou seja, à Terra Santa. Ela deteve-se em Belém, onde Jerônimo cuidava de uma comunidade de monges, e fundou um convento na região, com três divisões (para mulheres nobres, para mulheres livres e para escravas). Viveu ali uma vida ascética na companhia da filha Eustóquia, e esforçou-se sinceramente no caminho da perfeição, dedicando-se à oração, à penitência e ao estudo diligente da Palavra de Deus presente nas Sagradas Escrituras. Viveu assim até a sua morte, em 26 de janeiro de 404.

A vida exemplar deste que foi um dos primeiros modelos cristãos de mãe, esposa e viúva ficou assim registrada por Jerônimo, seu santo diretor espiritual.

Mesmo se todos os membros de meu corpo se transformassem em línguas (...) ainda assim não conseguiria descrever com justiça as virtudes da santa e venerável Paula. De família nobre, era ainda mais nobre em sua santidade; anteriormente rica em bens materiais, agora é celebrada pela pobreza com que viveu em nome de Cristo. (Tão inflamado era o seu fervor por Cristo, que decidiu abandonar o lar em Roma) (...), Para não alongar a história: desceu em Porto (porto de Roma) acompanhada do irmão, dos parentes e, principalmente, dos filhos, ávidos em suas demonstrações de afeto para conquistar a amável mãe. Enfim, as velas foram içadas e os remadores golpeavam a água, levando o navio a alto-mar. Na praia, o pequeno Toxócio estendia as mãos em súplica enquanto Rufina, já crescida, rogava a mãe, com silenciosos soluços, que esperasse até ela se casar. Porém, os olhos de Paula estavam ainda secos quando os dirigiu aos céus; e ela venceu o amor por seus filhos através de seu amor a Deus (...) Seu coração estava dilacerado de seu amor a Deus (...). Seu coração estava dilacerado, no entanto, e ela lutou contra essa dor como se a estivesse forçando a separar-se de partes de si mesma.

(Quando Paula chegou à Terra Santa), o administrador da Palestina, que era amigo íntimo da família, enviara antes seus agentes e dera ordens para que a residência oficial estivesse à disposição dela. No entanto, Paula escolheu para se um quarto humilde. (...) Ela não dormiu em uma cama comum, mas no chão duro, coberta apenas com um pedaço de pelo de cabra (...). Ela (...) dizia: "Devo deformar este rosto que, desobedecendo ao mandamento de Deus, pintei de vermelho, alvaiade e antimônio. Devo mortificar o corpo, entregue a tantos prazeres. Devo compensar minhas prolongadas risadas com o choro constante. Devo trocar minhas luxuosas sedas e o linho macio pelo áspero pelo de cabra. Eu, que no passado agradei a meu marido e ao mundo, desejo agora apenas agradar a Cristo. 

Depois de relatar muitos outros fatos admiráveis sobre essa nobre romana, São Jerônimo enfim descreve a sua morte.

Quem poderia narrar a morte de Paula com os olhos secos? Ela padecia de uma seríssima enfermidade (...). O intelecto de Paula mostrou-lhe que sua morte se aproximava. Seu corpo e membro esfriaram, apenas seu peito sagrado manteve a batida quente da alma viva. Como se estivesse a abandonar estranhos para voltar ao seu lar e ao seu povo, sussurrou os versos do salmista: "Eu amo, Senhor, o lugar da sua habitação, onde a tua glória habita" (Salmo 26,8), e "Quão amáveis são os teus tabernáculos, Senhor dos exércitos" (Salmo 83,2). Quando perguntei-lhe por que permaneceu em silêncio, recusando o meu chamado, e se sentia dor, ela respondeu, em grego, que já não sofria e que, a seus olhos, tudo parecia calmo e tranquilo. Depois ela não disse mais nada, e fechou os olhos, como se já tivesse se despedido de todas as coisas do mundo, e continuou repetindo os versos até quando exalou sua alma, mas em tom tão silencioso que mal podíamos ouvir o que dizia... E agora, adeus, Paula, e que com tua oração intercedas pela velhice deste que é teu devoto. [Jerônimo].      

quarta-feira, 27 de novembro de 2024

NICARÁGUA REFORMA CONSTITUIÇÃO E PODERÁ SE TORNAR UMA GRANDE INIMIGA DA IGREJA.

A Assembleia Nacional da Nicarágua aprovou por unanimidade a reforma da Constituição proposta pelo governo que transforma o presidente Daniel Ortega e sua mulher e o vice-presidente Murillo, em copresidentes do país.

Mais de 100 artigos da Constituição foram modificados pela proposta apresentada na quarta-feira (20/11) e aprovada pelos 91 deputados da assembleia na sexta-feira (22/11).

Ortega e Murillo serão também coordenadores dos poderes judiciários, eleitoral e legislativo. Eles também estenderam seus mandatos de cinco para seis anos.

O governo de Ortega já alterou a Constituição 12 vezes desde 2007, quando voltou ao pode e do qual não saiu desde então.

O governo também pode demitir funcionários públicos que não concordem com os "princípios fundamentais" do regime e limitar a liberdade de expressão, caso transgridam "o direito de outra pessoa, da comunidade e os princípios de segurança, paz e bem-estar estabelecidos na Constituição".

Martha Patrícia Molina, autora do relatório Nicarágua: Uma Igreja perseguida? - que em sua última edição relata 870 ataques do governo contra a Igreja Católica no país centro-americano entre 2018 e 2024 - disse recentemente, que também há temas religiosos nas reformas.

O Artigo 14 da atual constituição do país diz que o "Estado é laico e garante a liberdade de culto, fé e práticas religiosas em estrita separação entre o Estado e as igrejas". Estabelece também que "sob a proteção da religião, nenhuma pessoa ou organização pode realizar atividades que violem a ordem pública" e que "as organizações religiosas devem permanecer livres de qualquer controle estrangeiro". 

Para a advogada e pesquisadora, "as reformas propõe uma ruptura definitiva entre o papa, Sumo Pontífice da Igreja Católica e a Igreja Católica Nicaraguense. Com estas reformas, pode ser criada uma igreja paralela que não esteja em comunhão com o papa".

O advogado espanhol Xosé Luiz Pérez disse que o segundo parágrafo do artigo 14 é muito "perigoso", porque mesmo "50 pessoas reunidas numa igreja podem constituir um atentado à ordem pública". 
Reportagem: Walter Sánchez Silva.

segunda-feira, 25 de novembro de 2024

PAPA FRANCISCO CRITICA HIPOCRISIA DE PAÍSES QUE FALAM DE PAZ MAS BRINCAM DE GUERRA.


O papa Francisco criticou hoje (25/11) a hipocrisia de países que "falam de paz", mas "brincam de guerra" e onde "os investimentos que mais dão retorno são as fábricas de armas". Francisco falava num ato comemorativo no Palácio Apostólico do Vaticano por ocasião dos 40 anos do Tratado de Paz que pôs fim às tensões fronteiriças entre Argentina e Chile em 1984.

Esta atitude "sempre nos leva ao fracasso da fraternidade e da paz", disse o papa. "Espero que a comunidade internacional consiga fazer prevalecer a força do direito através do diálogo, porque o diálogo dever ser a alma da comunidade internacional". 

O acordo entre Chile e Argentina resolveu a disputa territorial sobre várias ilhas no Canal de Beagle. O então papa João Paulo II enviou como mediador o cardeal Antonio Samoré, que conseguiu o acordo entre as duas nações, evitando com conflito armado.

Falando às autoridades e ao corpo diplomático de ambos os países, entre os quais o embaixador argentino junto à Santa Sé, Luis Pablo Beltramino, e o chanceler chileno, Alberto van Klaveren, o papa Francisco elogiou a mediação pontifícia que evitou o conflito "que estava prestes a confrontar dois povos irmãos".

No discurso em espanhol, Francisco propôs este acordo como modelo a imitar, também renovou o seu apelo à paz e ao diálogo diante dos conflitos atuais, onde prevalece "o recurso à força".

Lembrou especialmente a mediação de são João Paulo II, que desde os primeiros dias de seu pontificado manifestou uma grande preocupação e demonstrou esforços constantes não só para evitar que a disputa entre Argentina e Chile "chegasse a degenerar em um infeliz conflito armado", mas também para encontrar "uma forma de resolver definitivamente essa controvérsia.

Ele disse que tendo recebido o pedido dos dois governo, acompanhado de esforços concretos, e exigentes, aceitou mediar com o objetivo de sugerir e propor" uma solução justa e equitativa e, portanto, honrosa".

Para Francisco, este acordo merece "ser proposto na atual situação do mundo, em que tantos conflitos persistem e se agravam, por não haver a vontade efetiva de excluir absolutamente o uso da força ou da ameaça para resolvê-los".

O papa lamentou que "estamos vivendo isto de uma forma bastante trágica" e disse que "podemos interpretar as oposições, o cansaço e as quedas como um chamado à reflexão, para que o coração se abra ao encontro com Deus e cada um tome a consciência de si mesmo, do próximo e da realidade".

Ele falou da necessidade de as autoridades serem "soberanos mendicantes", tornando-se "mendigos do que é essencial", do que dá sentido às nossas vidas". 

Segundo Francisco, "é a amizade com Deus, que mais tarde se reflete em todas as outras relações humanas, que é a base da alegria que nunca se extinguirá". 

Ele também disse que espera que "o espírito de encontro e de harmonia entre as nações, na América Latina e em todo o mundo, desejosas de paz, possa ajudar a multiplicar-se em iniciativas e políticas coordenadas, para resolver as muitas crises sociais e ambientais que afetam as populações de todos os continentes", prejudicando especialmente os mais pobres.

Francisco citou as palavras de Bento XVI no 25º aniversário do tratado, que disse que o acordo "é um exemplo luminoso da força do espírito humano e da vontade de paz face à barbárie e à irracionalidade da violência e da guerra como remédio para resolver diferenças.

Para o papa, este é um exemplo "mais atual do que nunca" de como é necessário perseverar em todos os momentos "com uma vontade firme e até as últimas consequências na tentativa de resolver as controvérsias com um verdadeiro desejo de diálogo e de acordo, através de negociações pacientes e compromissos necessários, e sempre levando em conta as demandas justas e os interesses legítimos de todos".

O que está acontecendo na Ucrânia e Palestina, concluiu o papa, são "dois fracassos" da humanidade, nos quais a "prepotência do invasor prima sobre o diálogo". 
Por: Almudena Martínez-Bordiú

quinta-feira, 21 de novembro de 2024

SÉRIE: SANTOS CASADOS

A santidade no matrimônio ao longo dos séculos.

SANTA MÔNICA e PATRÍCIO


Mônica, a mãe de Agostinho (o grande Padre da Igreja no Ocidente) nasceu em 331, em Tagaste, no seio de uma família cristã extremamente devota, que provavelmente pertencia ao pequeno círculo de habitantes do norte da África que assimilavam a cultura e moralidade e romanas. Os pais de Mônica confiaram a maior parte da educação de sua filha e uma severa governanta, que instruía a jovem a controlar-se, a mortificar-se e, também, a ter em grande estima a moralidade cristã.

Na aurora de sua juventude, Mônica foi prometida em casamento a um homem chamado Patrício, dono de uma pequena propriedade em Tagaste e integrante do conselho da cidade. Ele era pagão, porém um homem bom e justo, mas inclinado à ira e por vezes à violência. Amava Mônica profundamente, mas isso não o impedia de ter um comportamento rude e desleal. No entanto, a bondade e brandura de Mônica conseguiu conquistar o caráter vicioso do marido, bem como as fofocas da criadagem e irritabilidade da sogra. Por ter vencido essas circunstâncias, Mônica passou a ser respeitada e admirada por suas amigas.

Mônica tinha vinte e três anos quando deu à luz seu filho primogênito, Agostinmho. Além de Agostinho, teve outro filho, Navígio, e uma filha, Perpetua. Com grande esforço e dedicação, proporcionou aos três filhos uma verdadeira educação cristã. Sabemos que Agostinho nasceu e logo foi inscrito na lista de catecúmenos, mas, segundo as tradições da época, ainda não receberia o batismo. No entanto, como ele mesmo relatou, absorveu o nome do Senhor Jesus Cristo do leite de sua mãe, de maneira que a fé cristã enraizou-se até sua medula. A respeito de Perpétua, sabemos que casou-se, porém logo enviuvou, e assim permaneceu, ficando até a sua morte como superiora de um convento em Hipona, o monastério feminino. 

No ano de 371, Mônica perdeu seu cônjuge Patrício. Graças aos esforços da santa esposa, ele havia sido batizado no ano anterior e morrera cristão.

Os dezesseis anos entre a morte de seu marido e a conversão de seu filho Agostinho foram o período mais conturbado e doloroso da vida de Mônica. Ao mesmo tempo, porém, foi período mais belo, pois ela conseguiu viver e completar a sua missão e vocação. No ano de 385, depois de Agostinho enganar sua mãe, deixar a África e ir até Roma, Mônica preparou-se para ir atrás do filho. Ela tinha cinquenta e quatro anos na época, e depois de uma turbulenta travessia chegou a Itália e, em Roma, começou a sua busca por Agostinho. Inicialmente, não teve sucesso, mas seguiu em seu encalço e enfim o descobriu em Milão. Ali encontrou já livre do contágio de heresia maniqueísta, mas sua relação com o cristianismo ainda era vacilante. Cheia de amorosa preocupação, Mônica permaneceu ao lado de seu filho, e um anos mais tarde teve a alegria de celebrar sua conversão, depois de tantas lágrimas derramadas e tantas orações enviadas aos céus.

Na companhia de Agostinho, que havia se convertido mas ainda não havia sito batizado, Mônica retirou-se para Cassago, e ali, durante a Vigília de Páscoa, em 24 de abril de 387, seu filho recebeu do bispo Ambrósio o Sacramento do Batismo. Ela esteve presente na ocasião.

Mãe e filho queriam voltar à África alguns meses depois. Em Óstia Tiberina, enquanto esperavam um navio para fazer a travessia até a África, Mônica contraiu uma doença grave que a levou à morte. Ela faleceu em Óstia e ali foi sepultada, conforme era seu desejo.

Examinemos mais de perto o retrato dessa santa esposa, mãe e viúva, que nos foi deixado através das palavras de seu filho, em suas confissões.

Educada assim na modéstia e temperança, Vós a tornáveis mais submissa aos pais do que eles a tornavam obedientes a Vós. Quando chegou a idade núbil plena, deram-na em matrimônio a um homem, a quem servia como a senhor. Procurava conquistá-la para Vós, falando-lhes de Vós pelos seus bons costumes, com os quais a tornáveis bela, respeitosamente amável e encantadora aos olhos do marido. Sofria-lhes também as infidelidades matrimoniais com tanta paciência, que nunca teve discórdia alguma com o marido por este motivo. Esperava que a vossa misericórdia, descendo sobre ele, o fizesse casto, quando crescesse em Vós.

Se o coração do marido era afetuoso, o temperamento era arrebatado. Mas ela sabia que era melhor não resistir à ira do esposo, nem por ações nem por palavras. Logo que o via mais calmo e sossegado, oportunamente lhe dava a explicação da sua conduta, se por acaso ele irrefletidamente se irritava. Enfim, muitas senhoras tendo maridos muito mais benignos, traziam no rosto desfigurado, os vestígios das pancadas. Conversando entre amigas, insultavam a vida dos esposos. Minha mãe repreendia-lhes a língua, admoestando-se seriamente como por gracejo. Lembrava-lhes que, desde o momento em que ouviram o contrato de matrimônio, como quem escuta a leitura de um documento pelo qual são feitas escravas, elas de deviam considerar como tais. Por este motivo, tendo presentes essa condição não podiam ser altivas com seus senhores.

Estas matronas, conhecendo o mau gênio que ela suportava ao marido, admiravam-se de nada lhe ouvirem, nem por indício algum constar que Patrício lhe batesse ou que algum dia se desaviessem por questiúnculas domésticas. Perguntavam-lhe familiarmente a razão, e a minha mãe expunha-lhes seu modo de proceder, de que acima fiz menção. As que o punham em prática, depois de o experimentarem, felicitavam-na. As outras que não faziam caso, continuavam a ser envergonhadas e oprimidas.

A princípio a sogra irritava-se contra ela, por causa de uns mexericos de escravas malévolas. De tal forma minha mãe conquistou com afabilidades, com paciência e mansidão inalteráveis que a própria sogra espontaneamente denunciou ao filho as línguas intrigantes das escravas como perturbadoras da paz doméstica entre a nora e ela, e lhe rogou que fossem castigadas.

Com efeito, depois Patrício, dócil à mãe e solícito pelo bom governo da casa e pela concórdia entre os seus, mandou flagelar as culpadas, segundo o desejo de quem as acusara. A sogra declarou que podia espera igual castigo  quem quer que, para lhe agradar, lhe dissesse mal da nora. Ninguém ousou mais expor-se a tal risco e viveram as duas em doce harmonia, digna de ser lembrada.

Concedestes ainda um grande dom e esta fiel serva em cujo seio me criastes, ó meu Deus e minha misericórdia. Quando podia, mostrava-se conciliadora entre as almas discordes em desavença, a ponto de ainda referir de uma a outra senão o que podia levá-las a reconciliar-se, ouvindo de um lado e de outro as queixas amargas as quais costuma vomitar a discórdia encolerizada e cheia de ressentimentos, quando em presença de uma amiga, o vômito de rancores contra a inimiga ausente desabafa em azedas confidências.

De pouca importância me parecia este bem, se uma triste experiência não me mostrasse que um grande número de pessoas (não sei porque horrendo contágio de malícia, já espalhado por muito longe) não só repete a inimigos encolerizados o que uns zangados disseram de outros, mas ainda acrescenta coisas que eles não proferiram. Pelo contrário, deve ter-se em pouca conta para alguém dotado de sentimentos humanos, o não atiçar ou não acender, com ditos malévolos, as inimizades dos outros, se não procura também, com boas palavras , extingui-las.

Assim era minha mãe, como Vós, seu íntimo Mestre, a ensinastes na escola do coração. Enfim, até Vós ganhou o marido, nos últimos tempos desta vida temporal, e não teve mais a lamentar nele o que lhe sofrera antes de se converter. Era verdadeiramente a serva dos vossos servos! Todos os que a conheciam Vos louvaram, honradamente, honrando-Vos e amando-Vos nela, porque lhe sentiam no coração a vossa presença, comprovada pelos frutos de uma existência tão santa. Tinha sido esposa de um só marido, saldara aos pais a sua dívida de gratidão, governara a casa piedosamente. Com as suas boas obras, dava testemunho de santidade.

Educara os filhos, dando-os tantas vezes à luz, quantas os via apartarem-se de Vós. Enfim, ainda antes de ela adormecer no Senhor quando já vivíamos unidos em Vós pela graça do batismo, era tão desvelada para todos (já que por vossa liberalidade permitis que nos dirigimos aos vossos servos) como se nos tivesse gerado a todos, servindo-nos como se fosse filha de cada uma.

Em suas confissões, Santo Agostinho descreve a morte de sua piedade mãe, em Óstia, e como despediu-se de Mônica, que era um exemplo de esposa, mãe e viúva, e que pode realmente de modelo para todos os casais cristãos.

HOLBÖCK, Ferdinand. Santos Casados: A santidade no matrimônio ao longo dos séculos. P. 21, RS: Minha Biblioteca Católica 2020.
 
   

CANONIZAÇÕES DE CARLO ACUTIS E PIER GIORGIO FRASSATI JÁ TÊM DATA MARCADA.

O papa Francisco anunciou nesta quarta-feira (20/11) as datas de canonização de Carlo Acutis e Pier Giorgio Frassati, exemplos de santidade especialmente para os jovens de hoje.

No final da Audiência Geral, Francisco anunciou que Carlo Acutis será proclamado santo durante o Jubileu dos Adolescentes, que será em Roma, de 25 a 27 de abril de 2025. Num comunicado posterior, o arcebispo de Assis, dom Domenico Sorrentino, disse que a canonização de Acutis esta marcado para domingo, 27 de abril de 2025, às 10h30, na Praça de São Pedro.

Ele também informou que Pier Giorgio Frassati será elevado aos altares durante o Jubileu da Juventude, entre 28 de julho e 3 de agosto do próximo ano.

A data de canonização de Carlo Acutis era aguardada com ansiedade desde que o papa Francisco aprovou o milagre atribuído à sua intercessão em 23 de maio: Valeria Valverde, uma costarriquenha de 21 anos, sobreviveu milagrosamente a um grave acidente de bicicleta que a deixou à beira da morte com traumatismo craniano grave.

Acutis, conhecido por muitos como "o influenciador de Deus", cuja vida e amor pela Igreja e pela eucaristia ultrapassaram fronteiras, será elevado aos altares em um dos dias em que adolescentes de todo o mundo fazem uma peregrinação a Roma como parte do ano Jubilar. 

quarta-feira, 20 de novembro de 2024

TRÊS SANTOS QUE DEDICARAM A VIDA A PROTEGER E EVANGELIZAR OS NEGROS.

Hoje (20/11), é comemorado Dia Nacional da Consciência Negra. A seguir, a vida de três santos católicos que dedicaram suas vidas a proteger e a evangelizar os escravos negros na América e na África.

SANTA ROSA DE LIMA
A primeira santa do continente americano, padroeira da América, das Índias e das Filipinas, dedicou especial atenção à evangelização de índios e negros durante sua vida, entre o final do século XVI e o início do século XVII. Ela deu atenção preferencial à evangelização dos índios e negros".

E não podendo realizá-lo pessoalmente, contribuiu com suas orações e sacrifícios, além de arrecadar esmolas para que pudessem ser formados seminaristas pobres.

SÃO PEDRO CLAVER, O "ESCRAVO DOS ESCRAVOS"

Nascido em 1580 em Verdú, Espanha, são Pedro Claver, padre jesuíta, viveu a maior parte de sua vida e morreu em Cartagena das Índias, Colômbia, cuidado e evangelizando negros que foram levados para o continente americano como escravos.

Cartagena das Índias foi no século XVII um dos principais portos de entrada de escravos trazidos para os territórios hispânicos. Com a ajuda de catequistas poliglotas, são Pedro Claver abordou em todos os navios negreiros que entravam no porto".

Nos navios, com a ajuda de intérpretes, atendia os negros, alimentava, curava e evangelizava.

Ao fazer os votos perpétuos na Companhia de Jesus, São Pedro Claver assinou: Petrus Claver, aethiopum semper servus, que poderia ser traduzido como "Pedro Claver, escravo dos negros para sempre".

Estima-se que ele tenha batizado e evangelizado mais de 300 mil escravos durante as quatro décadas que viveu em Cartagena da Índias.

SÃO CHARLES DE FOUCAULD

O Francês são Charles ou Carlos de Foucauld, canonizado em 15 de maio de 2022, via a escravidão como uma "monstruosidade" e passou seus anos como eremita na África libertando e evangelizando escravos nas mãos dos nômades tuaregues na virada do século XX.

René Bazin, o primeiro biógrafo de Charles de Foucauld, cita-o comprometendo-se a "trabalhar com todas as nossas forças para abolir a escravidão.

quinta-feira, 14 de novembro de 2024

SÉRIE: SANTOS CASADOS.

A santidade no matrimônio ao longo dos séculos.

SANTO HILÁRIO DE POITIERS e ESPOSA.

Seria possível haver um bispo que, além de casado, fosse também um santo Padre e Doutor da Igreja? A resposta é sim: Santo Hilário, o notável bispo de Poitiers e bravo oponente do arianismo, doutrina que negava a divindade de Jesus Cristo e o rebaixava à condição de criatura. Muitas biografias de Santo Hilário não menciona o fato de ele ter sido casado e pai de uma filha, como se fosse algum constrangimento. Em outras, dedicadas a esse importante Padre e Doutor da Igreja, afirma-se que Santo Hilário era, sim, casado, talvez a intenção de usar a informação como um argumento contra o celibato clerical. Nesses casos, merecem uma análise mais atenta.

Hilário nasceu cerca de 315, em Poitiers, na Aquitânia (França), filho de uma família rica e pagã. Em sua cidade natal, e depois em Bordeaux, recebeu uma educação de elite, estudando principalmente gramática e retórica. Apesar de pagão, Hilário sempre repudiou os comportamentos ímpios de seus conterrâneos, que, sua maioria, viviam uma vida de luxúria e degradação moral. Tinha um alto cargo administrativo, e como era costume entre funcionários oficiais bem estabelecidos, casou-se. Seu matrimônio foi abençoado com a chegada de uma filha, que recebeu o nome de Abra.

Hilário tinha um grande anseio pela verdade, e esse anseio guiava cada vez mais seu coração junto e generoso, que não encontrava satisfação na filosofia pagã. Em seus esforços para chegar à essência das coisas, especialmente em relação ao sentido da existência humana, como que por acaso entrou em contato com as Sagradas Escrituras, e então, através de sua leituras com as Sagradas Escrituras, e então, através de sua leitura e mediante o auxílio da graça divina, acabou conhecendo a fé cristã. Por volta do ano de 345, Hilário, Abra, e sua esposa foram batizados na Vigília de Páscoa.

Se na época em que era pagão já vivia uma vida exemplar, como cristão Hilário passou a esforçar-se ainda mais, junto com a esposa e a filha. Os três passaram a ser exemplos para os seus companheiros cristãos em Poitiers, e tinham a melhor reputação possível. Por isso é compreensível que, quando a diocese de Poitiers ficou vacante, em cerca de 350, por decisão unânime Hilário foi considerado o mais digno candidato a suceder ao bispo anterior.

Hilário cedeu aos apelos dos cristãos locais e aceitou o cargo e as responsabilidades do episcopado. Às vezes menciona-se, clara e enfaticamente, que Hilário viveu em total abstinência a partir do momento em que foi consagrado como bispo. Se foi assim mesmo, a afirmação condiz com a conduta do santo bispo, que, mesmo quando pagão, sentia repulsa pelo estilo de vida desregrado e, em grande parte, imoral e corrupto, praticado por muitos de seus concidadãos. Pode-se também supor que quando Hilário chegou ao episcopado sua esposa já não estava mais viva. Ficava apenas Abra, sua filha, e o bispo sempre olhava por ela, como demonstra em uma carta. Mesmo que hoje em dia essa carta (Ad Abram Filiam) seja considerada ilegítima segundo alguns acadêmicos, seu conteúdo condiz perfeitamente com a atitude do Hilário como pai e bispo.

Devido à sua postura ortodoxa e anti-arinista, em 356 Hilário foi exilado para a Frígia, na Ásia Menor. Em 360 ou 361, foi enviado de volta a Poitiers. Ali, sua principal atividade foi guardar e reintroduzir a verdadeira fé. Reuniu o seu clero em uma sociedade a partir da qual nasceram as primeiras comunidades monásticas da Gália, através dos esforços de seu dedicado discípulo Martinho de Tours. A personalidade de Hilário agregava a diligência e senso de responsabilidade de um funcionário romano ao zelo de um ortodoxo pastor de almas: ele procurava unir a clareza à piedade, a compreensão mútua à unidade eclesiástica. Foi com essa mesma intenção, certamente, que ele viveu a união com sua esposa, antes de receber a ordenação episcopal. Por ter conhecido melhor a teologia oriental durante o exílio na Frígia, Hilário compreendeu (após voltar à sua terra natal, na Gália) como combinar a teologia oriental com a ocidental de maneira harmoniosa, como "casá-las", por assim dizer. Não é legítimo imaginar que também tenha sido assim em relação à harmonia com que viveu o seu casamento, antes de se tornar bispo? Além disso, como enfatiza em suas obras de teologia, esse Doutor da Igreja tinha plena convicção da compatibilidade entre fé e razão. Em seus escritos, deixa claro "o quão essencial, para um verdadeiro teólogo, é ter não apenas uma mente clara, mas sobretudo um coração repleto de fé". Uma mente clara e um coração repleto de fé": não é isso o necessário, especialmente entre casais cristãos, para se conduzir correta e pacificamente um bom matrimônio? Nesse sentido, Hilário poderia ser um exemplo para os cônjuges cristãos.

Hilário de Poitiers faleceu por volta do ano de 367. 

HOLBÖCK, Ferdinand. Santos Casados: A santidade no matrimônio ao longo dos séculos. P. 21, RS: Minha Biblioteca Católica 2020.   

terça-feira, 12 de novembro de 2024

SÉRIE: HISTÓRIA DOS PAPAS.

SÃO HIGINO
9º PAPA DA IGREJA
Pontificado 136-140 (4 anos)
Festa litúrgica 11 de janeiro

HISTÓRIA
Nasceu em Atenas, no Grécia, no ano 90, Higino era filho de um filósofo grego e, provavelmente, teve uma formação cultural e analítica mais ampla para sua época. Não são conhecidas muitas informações de sua vida, mas, como cristão, enfrentou as mesmas dificuldades da comunidade cristã de sua época, que era perseguida pelos pagãos. Seu pontificado iniciou no ano 136 e introduziu muitos costumes típicos e importantes da liturgia católica.

O Papa Higino sucedeu o Papa Telésforo e se esforçou em tornar mais precisa a questão da hierarquia no interior da Igreja. E parece mesmo que o Papa Higino gostava bastante de ordem, foi ele também quem introduziu o costume da existência do padrinho e da madrinha no batismo. Outra tradição amplamente difundida e praticada entre os católicos.

Além dessas marcas tradicionais do ritual e da estrutura católica, o Papa Higino enfrentou as típicas perturbações causadas pelas constantes perseguições as seguidores da fé cristã. Para o cristianismo primitivo, essa era uma condição comum, não diferente daquela enfrentada por muitos outros papas. Mas uma preocupação de seu pontificado foi e relação ao que se considerava como heresia, que nascia e começava a tomar forma naquele momento. O papa Higino identificou e condenou heresias e seus heresiarcas, conquistando vitória sobre eles.

Outro tipo de desafio aguardava Higino. Ele teve que excomungar e anatematizar o herege Cerdão, que pregava a existência de dois deuses. Um deles era o Deus, severo e difícil do Antigo Testamento, e o outro, o Deus bondoso do Novo Testamento, que enviara seu filho à Terra para libertar a humanidade da tirania do antigo  Deus. Este último, segundo Cerdão, era Jesus Cristo, que, na visão do herege, não teria realmente encarnado ou sido crucificado, mas apenas causado essa ilusão. Essencialmente, isso refletia o gnosticismo dualista, uma doutrina que ressurge periodicamente ao longo da história da Igreja. Alguns seguidores mais radicais dessa vertente afirmavam que, como Deus era maligno, todos os heróis do Antigo Testamento também seriam maus, enquanto seus inimigos seriam bons. Além disso, identificavam o demônio do Antigo Testamento com o Pai do Novo Testamento. Essa crença se baseava na antiga ideia de que a matéria (e seu criador) eram maus, sendo uma armadilha para as almas humanas. O verdadeiro Deus seria o criador apenas do espírito.  

Não há a certeza sobre a causa da morte do Papa Higino, mas registros indica que ele foi martirizado após quatro anos de pontificado, com  50 anos de idade no ano 140. Ele foi enterrado próximo à tumba de São Pedro.




quinta-feira, 7 de novembro de 2024

SÉRIE: SANTOS CASADOS.

A santidade do matrimônio ao longo dos séculos.

SÃO GREGÓRIO DE NAZIANZO e SANTA NONA.

São Gregório de Nazianzo, o Velho é um santo da Igreja Oriental. Foi casado com Santa Nona, que deu a ele três filhos.

Gregório nasceu por volta do ano 274. Era um rico proprietário de terras em Arianzo, perto de Nazianzo, e funcionário de alto escalão do governo. Quando à sua visão de mundo, no início pertenceu a uma peculiar seita que reunia em suas crenças uma mistura de elementos pagãos e judeus e adoravam a "Zeus Hipsisto", o Deus "altíssimo". 

Graças a Santa Nona, sua esposa cristã, aos quarenta e cinco anos Gregório converteu-se ao cristianismo. Foi batizado em 325 e passou a dedicar-se de todo coração à sua fé na congregação cristã de Nazianzo, na Capadócia, onde foi eleito como bispo quatro anos depois, em 329.

Ao aprovar a fórmula arianizante do Sínodo de Rimini (359), o bispo Gregório, o Velho, fez com que se revoltassem contra ele os monges de Nazianzo. Seu filho Gregório, o Jovem, interveio nesse desentendimento e reconciliou-os, graças a seu prestígio e ao seu dom de retórica.

Em 374 morreu o bispo Gregório de Nazinzo, o Velho com quase 100 anos de idade. Seu filho, que também era bispo, proferiu a oração fúnebre.

SANTA NONA, esposa de São Gregório de Nazianzo, o Velho, era filha de um certo Filâncio. A julgar pela descrição que seu filho São Gregório de Nazianzo, o Jovem, fez no discurso fúnebre para o pai, assim como nas orações fúnebres para o irmão Cesário e a irmã, Gorgônia, Santa Nona provavelmente foi um modelo de esposa e mãe cristã: sempre esforçando-se em praticar as virtudes cristãs e levar um vida genuinamente piedosa; era devota e modesta em extremo e demonstrava um profundo amor pelos pobres. Acima de tudo, criou seus três filhos de tal maneira que plantou em cada um os alicerces para sua futura santidade.

Santa Nona concluiu sua santa vida em 374. Morreu na igreja que costumava frequentar, durante a celebração da Eucaristia. O grande historiador da Igreja, César Barônio, empenhou-se em promover no Ocidente a devoção litúrgica a essa nobre mulher e mãe, incluindo-a no Martirológio Romano no dia 5 de agosto. 

HOLBÖCK, Ferdinand. Santos Casados: A santidade no matrimônio ao longo dos séculos. P. 33, RS: Minha Biblioteca Católica 2020.